ANÁLISE: Vale a pena comprar um automóvel eléctrico?
Perante o preço dos combustíveis e face ao surgimento de modelos 100 por cento eléctricos coloca-se a questão: valerá a pena pagar, seguramente, mais de 20 mil euros para ter um carro eléctrico com capacidade para mais de dois ocupantes? Sabendo que se está condicionado a uma autonomia de pouco mais de 100 km e não é seguro encontrarmos um posto de carga justamente quando mais precisamos dele?
Percorrer mais de 100 km por pouco mais de dois euros de custo de energia é, seguramente, razão válida para dispor de um carro eléctrico. Depois aparecem as contrariedades: autonomia, tempo de carga das baterias e preço do veículo.
Recentemente, o antigo responsável pelo AICEP, Agência para o Investimento em Portugal, criticou a passividade do actual governo ao deixar cair o projecto Mobi-e, projectado pelo anterior governo. Ainda que o actual Ministro da Economia, Álvaro Santos Pereira tenha garantido que “o projecto do Mobi-e não foi abandonado” mas que “existem reformas estruturais mais urgentes” neste momento, a verdade é que os indícios parecem revelar exactamente o contrário.
Postos fora de serviço
Nos dias em que tive oportunidade para ensaiar o familiar eléctrico da Renault, o Fluence, ou o da Nissan, o Leaf, raramente encontrei um único posto de carregamento público de baterias a funcionar na área de Lisboa. Os únicos que pareciam estar em condições para o fazerem situavam-se em Centros Comerciais.
Para quem não sabe, estes postos activam o fornecimento de energia após a leitura de um cartão MOBI-E com as informações do cliente. Resta depois inserir uma das tomadas do cabo no posto de fornecimento de energia, a outra no local próprio da viatura e aguardar que as baterias se encontrem com carga suficiente para percorrer os quilómetros desejados.
Perante o que se coloca nova questão: salvo os postos de carregamento rápido (muito poucos, o mais prático fica na A5, auto-estrada de Cascais, estação de serviço da Galp), que garante uma carga razoável em 20 minutos/meia hora, em todos os restantes é necessário esperar várias horas para obter, pelo menos, carga suficiente para meia centena de quilómetros.
O que, à partida, não seria grande obstáculo para quem utilize um carro eléctrico na sua deslocação casa/trabalho, por exemplo. O problema é que, situando-se na via pública, existe o sério risco de, no retorno, já não existir cabo de energia por alguém o ter levado… por engano.
Contudo, quem habita ou trabalha na periferia de e tenha um raio de acção que não implique circular mais de 120 quilómetros com um único carregamento, poderá poupar, e muito, com uma viatura eléctrica. Com um carro a gasóleo ou a gasolina, dificilmente percorrerá essa distância por menos de quatro ou cinco vezes o preço da energia necessária para carregar as baterias. E se é verdade que há que ter em conta a diferença de preço de um veículo eléctrico, este também implicará, à partida, um custo de manutenção menos elevado. Praticamente deverá circunscrever-se ao equipamento partilhado com as viaturas térmicas: ar condicionado, iluminação, sistema de travagem, escovas limpa-vidros, etc.
Por fim, não menos importante, é preciso dispor, no local de trabalho ou na residência, de um local prático para proceder ao carregamento das baterias. Preferencialmente numa garagem, bastando, para o efeito, os préstimos de uma vulgar tomada doméstica de 220 Volts.
MOBI-E e incentivos
Uma das apostas do anterior governo no plano de mobilidade eléctrica passava por estimular as entidades públicas, empresas e cidadãos individuais a adquirirem uma viatura eléctrica.
Decisivo foi a disseminação de uma vasta rede de postos de carga, capazes de tranquilizarem os proprietários de carros eléctricos; é que ver aproximar-se o fim da autonomia e desconhecer se existe ou não um posto de carga próximo e se este está ou não a funcionar é factor suficiente para gerar muita ansiedade.
Hoje, a maioria desses postos encontra-se fora de serviço. Não raras vezes, com viaturas não eléctricas estacionadas a obstrui-los. Em duas ocasiões, na Av.ª 24 de Julho em Lisboa, liguei para o número fornecido pelos serviços MOBI-E, para relatar a avaria dos postos. Sem sucesso, uma vez que ninguém atendeu a chamada.
Outra forma de incentivo criada pelo anterior governo, passou por um “desconto” de 5000 mil euros na aquisição das primeiras 5000 viaturas eléctricas. A que se poderia juntar ainda o incentivo ao abate de viaturas com mais de 10 anos.
Facto é que a última legislação relacionada com este empreendimento data de Novembro de 2011 e diz exactamente respeito à revogação do Decreto-Lei n.º 39/2010, de 26 de Abril, que cria e regulamenta os incentivos financeiros na aquisição de veículos exclusivamente eléctricos.
Estagnado o projecto MOBI-E, inserido no “plano nacional para a eficiência energética”, desperdiçados os milhões de euros até agora investidos, Portugal arrisca-se ainda a perder em duas frentes: uma no plano da imagem internacional (o nosso País é líder em tecnologias de aproveitamento de energias renováveis), outra no plano do investimento e da criação do emprego. O primeiro sinal aconteceu quando a Nissan anunciou o cancelamento das obras para a instalação de uma fábrica para o fabrico de baterias para o Leaf e, mais do que provavelmente, outras baterias para modelos do grupo Renault/Nissan.
Compare-se AQUI com importância que a Noruega dá ao assunto e os resultados que obtém.
Prosaicamente existem outras questões importantes que mereciam ser debatidas, mas que levariam a análises ainda mais exaustivas: a renovação do parque automóvel, que colocaria fora de circulação viaturas altamente poluentes, e a consequente redução dos níveis de CO2 em respeito pelas cotas de emissões de gases a que Portugal se vê obrigado no seio da União.
Pelo andar da carruagem, esta última será a mais fácil de resolver: não tarda, sobre rodas, pouco mais resta aos portugueses do que a bicicleta. Vale o facto de isso trazer benefícios para a saúde!
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